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“Agricultura é a única solução para acabar com a fome em África”

A angolana Josefa Sacko é candidata a um segundo mandato para o cargo de comissária da União Africana para a Agricultura, Economia Rural, Economia Azul e Ambiente.

A engenheira agrónoma afirma em entrevista à RFI que se for eleita a auto-suficiência alimentar do continente será uma das suas prioridades e garante que a aposta na agricultura é a solução para combater a fome em África.

RFI: Reconhece que África tem um grande potencial agrícola, mas que continua a depender dos alimentos que importa. O que é preciso fazer para assegurar a auto-suficiência alimentar que ficou ainda mais exposta com a crise sanitária da Covid 19?

Josefa Sacko: Temos de conseguir alcançar a auto-suficiência alimentar, não devemos depender da importação, uma vez que temos o potencial para produzir. Hoje temos uma factura de importação de bens alimentares a rondar os cerca 45 mil milhões de dólares anual isto é muito e pode representar uma oportunidade para o sector. Não podemos dar a oportunidade a outros mercados.

Eu defendo ainda a questão do investimento. Em 2003, na Declaração de Maputo, os nossos chefes de Estado decidiram que, pelo menos, 10% das despesas públicas deviam de ser investidas no sector agrário. Se os Estados membros implementarem esta decisão vão ter resultados positivos. O terceiro factor, e não menos importante, é a modernização da agricultura, porque o rendimento da nossa colheita ainda é muito baixo em África.

A senhora quer criar reservas alimentares. Como é que vão funcionar estas reservas?

O Covid mostrou que a maior parte dos nossos países africanos importam arroz do mercado asiático e durante a pandemia os países pararam com a exportação, bloquearam as suas exportações para África. Como é que nos vamos alimentar se não podemos importar esses produtos? Isso é uma boa lição para começarmos a ter as nossas próprias reservas alimentares no continente. Por isso, defendo a criação de Agroparques ou Hubs em cada região, tendo em conta a vantagem do seu ecossistema nestas regiões.

A criação das reservas alimentares pode ser facilitada através da Zona Africana de Comércio Livre?

A Zona Africana de Comércio Livre é que nos levou a desenvolver esta iniciativa. Estamos a olhar para a integração regional do nosso comércio ao nível intra-africano.

Os países africanos estão todos em pé de igualdade?

Isto é uma estratégia continental. Há países que têm excesso de produção, outros têm deficiência de produção, estamos a olhar para a vantagem comparativa de cada região ecológica. Caso seja eleita vou tentar implementar estas reservas alimentares. Neste momento, estamos a trabalhar com o Banco Africano do Desenvolvimento, porque é um mega-projecto, e com o Banco Africano de Importação e Exportação para percebermos como é que vamos operacionalizar esta iniciativa, aprovada já pelos nossos chefes de Estado.

Se for eleita para um segundo mandato quer privilegiar a Economia Azul e o Ambiente, sectores que passa a tutelar. De que forma pensa fazê-lo?

Trabalhámos com os 38 países africanos que têm costa. Trabalhámos e fomos para além da costa, olhamos ainda para os rios, os mares. Há neste sector muitas oportunidades, por isso é muito importante desenvolver a Economia Azul. O Ambiente já estava dentro do departamento, queremos ver se aceleramos a implementação do Acordo de Paris.

Considera que a operacionalizarão do Acordo de Paris tem falhado. O que é que é preciso fazer para que se comecem a sentir mudanças no continente?

O continente africano não está na fase de implementação deste acordo por falta de funcionamento. Sabe que o continente africano não tem muita responsabilidade nas alterações climáticas.

Mas não são os que estão mais expostos?

Sim, mas temos de respeitar para não agravar ainda mais a situação ambiental do nosso planeta. Apesar de termos problemas sérios de financiamento, muitos países estão a implementar os programas de adaptação e retiram cerca de 2% do seu orçamento para financiar esses programas. Isto é muito importante, as catástrofes ambientais estão a aumentar. Então, temos de criar resiliência e adaptarmo-nos aos impactos das alterações climáticas.

O Banco Mundial, o Fundo Verde para o Ambiente e a União Europeia têm ajudado muito a União Africana. Nomeadamente, no caso da Grande Muralha Verde, a União Europeia está a ajudar-nos a plantar árvores e a combater a desertificação.

Promete, num segundo mandato, concentrar a sua atenção na Declaração de Malabo que, entre outros, pretende acabar com a fome e a pobreza em África em 2025. Acredita que essa meta seja possível?

Acredito, nós temos quatro anos. Durante o meu primeiro mandato, conseguimos fazer a monitorização e a avaliação dos nossos Estados membros. Hoje podemos falar com evidência que sabemos qual é o país que está a fazer progressos. Trinta se seis países fizeram progressos [a União Africana tem 55 Estados membros] na redução da pobreza, no investimento feito na agricultura, na erradicação da fome.

Acredito que nos próximos quatro anos, se acelerarmos a nossa dinâmica, vamos alcançar as metas fixadas no plano de acção de 10 anos da agenda 2063.

A agricultura é a solução para combater a pobreza em África?

Vou-lhe falar-lhe do caso da Angola. Angola, antes da independência, foi o segundo maior produtor de café em África, a nível mundial. Angola foi desenvolvida pela agricultura. Eu sou agrónoma, acredito na agricultura.

Vimos que a transformação na Costa do Marfim foi através dagricultura. Até hoje é a agricultura. Acredito que África tenha esse potencial, 60% das terras aráveis estão neste continente. Precisamos de priorizar a nossa visão e passar à implementação.

A angolana Josefa Sacko é candidata a um segundo mandato para o cargo de comissária da União Africana para a Agricultura, Economia Rural, Economia Azul e Ambiente. A eleição acontece em Addis Abeba, Etiópia, na cimeira de chefes de Estado nos próximos dias 6 e 7 de Fevereiro. Os adversários de Josefa Sacko nesta corrida são os representantes da Gâmbia, Uganda e Marrocos, no entanto a candidata é dada como favorita.

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