Exalgina Gambôa, a ex-presidente do Tribunal de Contas de Angola, que foi constituída arguida em fevereiro de 2023 por suspeitas de crimes como peculato, abuso de poder, tráfico de influência e branqueamento de capitais, ganhou uma batalha ao Estado, em particular à Procuradoria-Geral da República (PGR), materializada no facto do Tribunal Constitucional ter dado provimento ao recurso extraordinário de inconstitucionalidade por ela apresentado relativo às medidas de coação que lhe tinham sido impostas.
A antiga líder do Tribunal de Contas, no seu requerimento, contestava as medidas impostas desde 2023, em particular a apreensão de passaporte. Os juízes do Constitucional angolano vieram agora dar razão a Exalgina Gambôa, considerando que “a medida de interdição de saída do país aplicada à recorrente excedeu, largamente, os prazos estabelecidos na lei e não se se encontra justificada por qualquer substrato fático ou jurídico”.
O acórdão do Constitucional conclui que o despacho que determinou a apreensão do passaporte da visada “deve ser declarado inconstitucional e, por isso, extinta a medida de coação pessoal imposta, por violação dos princípios constitucionais da legalidade, da presunção da inocência, do direito à liberdade física e da liberdade de residência, circulação e emigração”.
Esta decisão do Tribunal Constitucional coloca em xeque a Procuradoria-Geral da República, liderada por Hélder Pitta Grós, e o Ministério Público por terem falhado os prazos para formalizarem a acusação contra a juíza. Aliás, este é o principal argumento exposto por Exalgina Gâmboa no seu recurso. “Tendo decorrido mais de 24 meses desde a imposição da medida sem que tenha havido qualquer acusação formal ou desenvolvimento processual relevante, verifica-se o esgotamento de todos os prazos legalmente admissíveis, extinguindo a referida medida de coação imposta”.
Este acórdão do Tribunal Constitucional constitui igualmente um revés político para o Presidente da República, João Lourenço, que tinha convidado Exalgina Gambôa a renunciar ao cargo que então ocupava devido a sinais de que havia praticado crimes de extorsão e corrupção no exercício do cargo. O caso foi igualmente visto como uma aposta no sentido de moralização do Estado, já que a juíza persistia em manter bens, nomeadamente um carro e uma casa, que lhe tinham sido atribuídos em função do lugar que ocupava mesmo depois de já se ter demitido.
“As aventuras de Exalgina Gambôa espelham a mentalidade dos dirigentes do país das maravilhas, que confundem o seu bem-estar pessoal com a coisa pública. O país das maravilhas é um lugar onde as regras normais não se aplicam, por isso, Exalgina Gambôa faz o que quer e como quer, e ainda lhe pedem para cumprir a lei”, escreveu Moiani Matondo, no site Maka Angola, em julho de 2024.
A possibilidade que se abre agora da antiga presidente do Tribunal de Contas poder sair do país é uma derrota para a PGR angolana, instituição que garantia em janeiro deste ano que o processo da juíza continuava em instrução preparatória. Um quadro penalizador para João Lourenço dado que o chefe de Estado se empenhou pessoalmente no processo que conduziu ao afastamento de Exalgina Gambôa.