Paul Biya, de 92 anos, foi reeleito para um oitavo mandato nos Camarões com 53,66% dos votos, segundo o Conselho Constitucional. O opositor Issa Tchiroma Bakary contesta os resultados e reivindica vitória. Para o politólogo angolano e deputado da UNITA, Olívio Kilumbu, a reeleição simboliza o atraso democrático africano, a falta de alternância e o conflito entre uma elite envelhecida e uma juventude que exige mudança.
O Conselho Constitucional dos Camarões anunciou, esta segunda-feira, 27 de Outubro, a reeleição de Paul Biya, de 92 anos, para um oitavo mandato consecutivo como Presidente da República. No cargo desde 1984, Paul Biya obteve 53,66% dos votos, contra 35,19% atribuídos ao seu principal adversário, Issa Tchiroma Bakary.
Issa Tchiroma Bakary contesta os resultados oficiais e reclama a vitória, afirma ter obtido 54,8% dos sufrágios contra 31,3% para o Presidente cessante, segundo a própria contagem. O Conselho Constitucional rejeitou todos os recursos apresentados antes de validar os resultados, quinze dias depois do escrutínio, conforme previsto pelo código eleitoral.
Na véspera da proclamação dos resultados, foram registados confrontos entre as forças de segurança e manifestantes da oposição que fizeram quatro mortos. Centenas de apoiantes de Issa Tchiroma Bakary saíram às ruas em várias cidades do país, em resposta a um apelo do candidato para manifestações pacíficas. Num vídeo publicado nas redes sociais, Issa Tchiroma Bakary declarou que “o povo camaronês, na sua imensa maioria, jamais aceitará a validação de uma eleição fraudulenta”.
O ministro da Administração Territorial, Paul Atanga Nji, reagiu e acusou os organizadores dos protestos de “criar condições para uma crise de segurança” e de “participar num projecto insurreccional”.
Dois dirigentes de partidos da coligação que apoiou Issa Tchiroma Bakary, Djeukam Tchameni (Movimento para a Democracia e Interdependência dos Camarões) e Anicet Ekane (Movimento Africano para a Nova Independência dos Camarões), foram detidos na sexta-feira, 24 de Outubro, em Douala.
Para o politólogo angolano e deputado da UNITA, o maior partido da oposição, Olívio Kilumbu, a reeleição de Paul Biya representa “um dos grandes sinais do atraso do continente africano”. Segundo o politólogo, “a alternância não é vista como um elemento fundamental da cultura política, e o que se passa é que, depois de oito mandatos, quase quatro décadas e meia de governo do mesmo indivíduo, não há progresso significativo num dos países mais importantes de África, com uma história rica, recursos minerais estratégicos e uma população jovem”. O deputado Olívio Kilumbu sublinha que a juventude camaronesa reage de forma negativa a mais um mandato de Paul Biya, uma vez que há fortes indícios de que as eleições não foram justas nem transparentes. Para ele, o conflito entre a legalidade e a legitimidade volta ao centro do debate.
Questionado sobre o impacto da reeleição na estabilidade política e nas perspectivas democráticas dos Camarões, Olívio Kilumbu considera que o país “não evoluirá democraticamente”. Afirma que “a reeleição só é legítima quando conquistada por via da boa governação, e o que se observa é um choque entre um cidadão com quase cem anos e uma população cuja média de idade ronda os vinte e quatro anos. Não há relação possível”. Para o politólogo, a falta de renovação política afasta o investimento estrangeiro directo e destrói a confiança entre o governo e os cidadãos. “O povo sabe em quem votou e exige responsabilidades, seja do candidato proclamado vencedor, seja daquele que reivindica a vitória. É uma situação semelhante ao que aconteceu em Angola em 2022: um grupo político captura o Estado e as suas instituições e faz delas o que quer”, declarou o deputado da UNITA.
Olívio Kilumbu alerta ainda que a estabilidade que se vislumbra nos Camarões poderá ser apenas mantida pela força. “O país corre o risco de viver uma espécie de pax romana, com o exército nas ruas. Contudo, nota-se que até a própria polícia começa a conter-se, porque percebe que a voz do povo é mais forte do que qualquer política repressiva”. Apesar dos repetidos apelos internos e internacionais à mudança, o deputado lamenta que o poder político camaronês se mantenha refém de uma elite. “Os apelos não vieram apenas dos camaroneses, mas também de líderes africanos, da União Africana e de antigos Presidentes. O que observamos é a conservação do poder — que é diferente da sua manutenção. A conservação é o esforço de uma elite em reter o poder a qualquer custo; a manutenção é democrática e obtém-se apenas através da boa governação. E boa governação é precisamente o que não existe nos Camarões”, defende. Olívio Kilumbu conclui afirmando que “haverá um conflito forte entre a geração Z e a classe política camaronesa”, sublinhando que “a juventude exige mudança e futuro, enquanto a velha guarda se agarra ao passado e ao poder”.








