O relógio está a contar: o African Growth and Opportunity Act (AGOA), o acordo comercial entre os Estados Unidos e os países da África subsaariana, termina esta terça-feira, 30 de setembro. Após longos meses de incerteza sobre a sua renovação, este acordo de 25 anos – que concedia aos países membros acesso isento de taxas ao mercado norte-americano – poderá tornar-se parte da história.
“Estudos mostram que o AGOA teve efeitos positivos. As exportações para os EUA aumentaram, por exemplo, no setor têxtil”, afirma Zoryana Olekseyuk, investigadora do Instituto Alemão para o Desenvolvimento e Sustentabilidade (IDOS), especializada em transformações económicas e sociais.
No entanto, Olekseyuk sublinha, em entrevista à DW, que o balanço é misto: “O impacto global na região é limitado e varia de país para país e de setor para setor.” Ao longo do tempo, outros parceiros comerciais foram ganhando importância.
O AGOA foi criado no ano 2000, sob a presidência de Bill Clinton. Contudo, o regresso de Donald Trump à Casa Branca em 2025 sinaliza um regresso ao protecionismo e a tarifas alfandegárias elevadas e, muito provavelmente, o fim definitivo do AGOA.
Atualmente, 35 países africanos beneficiam do acesso preferencial ao mercado dos EUA: cerca de 7.000 produtos podem ser exportados sem tarifas. Setores como o têxtil, o agrícola ou o mineiro, desenvolveram-se graças a isso, criando milhares de empregos, sobretudo no Madagáscar, no Lesoto e na África do Sul.
Hoje, essas conquistas estão em risco. Malick Sané, especialista em comércio internacional da Universidade Cheikh Anta Diop, em Dakar, alerta: “As empresas africanas terão grandes dificuldades em continuar a competir com os seus produtos no mercado norte-americano.” Isso levará a uma diminuição da produção e da criação de empregos.
A África do Sul, o maior exportador africano para os EUA, receia perder mais de 35.000 postos de trabalho apenas no setor dos citrinos.
Produtos como platina, ouro, diamantes ou terras raras – fontes essenciais de rendimento para países como África do Sul, Gana,Lesoto, Namíbia e Madagáscar – também ficarão sujeitos a tarifas. Madagáscar, por exemplo, terá de pagar uma taxa de 47% sobre as exportações de baunilha e produtos têxteis.
O governo norte-americano chegou a ameaçar o Lesoto, especialista na produção de calças de ganga (“jeans”), com uma tarifa recorde de 50%, valor que em julho foi reduzido para 15%. As exportações industriais das Maurícias poderão ser taxadas em 40%.
Olekseyuk sublinha que o comércio com os EUA já vinha diminuindo há alguns anos: “Em 2017, apenas 8,5% das exportações dos países do AGOA tinham como destino os EUA – muito menos do que para a Europa ou a China.” Além disso, poucos exportadores africanos tiraram verdadeiro proveito do AGOA, acrescenta: “Muitas vezes, os benefícios não eram suficientes para compensar o esforço administrativo.”
A incerteza sobre a continuidade do programa, as exclusões de países e a relutância de investidores enfraqueceram o seu impacto.
Perante este cenário, alguns países, como o Zimbabué, decidiram eliminar unilateralmente as suas próprias barreiras aduaneiras para aliviar a pressão. A África do Sul e Madagáscar continuam a negociar exceções específicas.
Para o economista maliano Etienne Fakaba Sissoko, este é um momento de viragem: “Os países africanos devem aproveitar esta oportunidade para se libertarem da dependência de outros. Durante 25 anos, o AGOA foi apresentado como um presente. Na realidade, serviu sobretudo os interesses geopolíticos dos Estados Unidos.”
O AGOA criou oportunidades, mas não transformou estruturalmente as economias africanas. “O fim do programa deve marcar a transição de uma lógica de ajuda para uma lógica de autonomia”, defende Fakaba.
A verdadeira prioridade, segundo o economista, passa por mais investimento em infraestruturas e desenvolvimento tecnológico. “Devemos construir uma soberania económica africana, que não dependa mais dos caprichos de Washington, nem de qualquer outro país.”
A União Africana (UA) tem vindo a insistir na necessidade de consolidar a Zona de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA), em vigor desde 2021, como forma de reforçar a independência económica do continente. Esta zona, que abrange 54 países com cerca de 1,55 mil milhões de habitantes, poderá tornar-se mais atrativa para as empresas, afirma também o especialista Sané.
DW